sábado, 26 de outubro de 2013

Fiz como nos livros.
Dividi-me em sete dias. […]
Espalhei os dez dedos pelos dias e, primeiro, criei os céus e as areias daquele lugar que não havia.
Depois, os dois luzeiros: um para o dia e outro para a noite do deserto.
No terceiro dia, fiz uma casa com um alpendre e uma cadeira no alpendre.
Foi então que senti o sangue bater na minha noite e soube do sinistro silêncio de toda minha vida, e era o quarto dia. […]
E no sétimo dia vi que tudo tinha um sentido, e sentei-me na minha casa, no meu alpendre, na minha cadeira.
Pela escrita tinha eu pois chegado ao sétimo dia, ligando tudo, ligando o que não é visível mas como é audível, semelhante às correntes de água subterrânea que o nosso próprio corpo solitário sente deitado sobre a terra.[…]


excertos de Apresentação do Rosto, Herberto Hélder, 1968

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