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domingo, 5 de janeiro de 2014

UM POEMA DE NUNO JÚDICE 

Quero dizer-te uma coisa simples:
a tua Ausência dói-me.
Refiro-me a essa dor que não
Magoa, que se limita à alma, mas que não deixa,
Por isso, de deixar alguns sinais - um peso Nos olhos, no lugar da tua imagem, e
Um vazio nas mãos, como se tuas mãos lhes
Tivessem roubado o tato. São estas as formas
Do amor, podia dizer-te; e acrescentar que
As coisas simples também podem ser complicadas,
Quando nos damos conta da diferença entre o sonho e a realidade.
Porém, é o sonho que me traz à tua memória; e a
Realidade aproxima-te de ti, agora que
Os dias que correm mais depressa, e as palavras
Ficam presas numa refração de instantes,
Quando a tua voz me chama de dentro de
Mim - e me faz responder-te uma coisa simples,
Como dizer que a tua ausência me dói.

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Queria ser essa noite que te envolve...

Queria ser essa noite que te envolve; e 
cobrir-te com o peso obscuro dos braços 
que não se vêem. 
Um murmúrio 
desceria de uma vegetação de palavras, 
enrolando-se nos teus cabelos como
secretas folhas de hera num horizonte
de pálpebras. Deixarias que te olhasse
o fundo dos olhos, onde brilha
a imagem do amor. E sinto os teus dedos
soltarem-se da sombra, pedindo
o silêncio que antecede a madrugada."


NUNO JÚDICE

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

De onde vem...

De onde vem - a voz que
nos rasgou por dentro, que
trouxe consigo a chuva negra
do outono, que fugiu por
entre névoas e campos
devorados pela erva?

Esteve aqui — aqui dentro
de nós, como se sempre aqui
tivesse estado; e não a
ouvimos, como se não nos
falasse desde sempre,
aqui, dentro de nós.

E agora que a queremos ouvir,
como se a tivéssemos re-
conhecido outrora, onde está? A voz
que dança de noite, no inverno,
sem luz nem eco, enquanto
segura pela mão o fio
obscuro do horizonte.

Diz: "Não chores o que te espera,
nem desças já pela margem
do rio derradeiro. Respira,
numa breve inspiração, o cheiro
da resina, nos bosques, e
o sopro húmido dos versos."

Como se a ouvíssemos.

Nuno Júdice

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Sonhei contigo

Sonhei contigo

Sonhei contigo
embora nenhum sonho possa ter habitantes
tu, a quem chamo amor,
cada ano pudesse trazer um pouco mais de convicção
a esta palavra.

É verdade
o sonho poderá ter feito com que,
nesta rarefacção de ambos,
a tua presença se impusesse
como se cada gesto do poema te restituisse um corpo
que sinto ao dizer o teu nome,
confundindo os teus lábios
com o rebordo desta chávena de café já frio…

Então, bebo-o de um trago.
o mesmo se pode fazer ao amor,
quando entre mim e ti
se instalou todo este espaço
-terra, água, nuvens, rios e o lago obscuro do tempo
que o inverno rouba à transparência das fontes.

É isto, porém, que faz com que a solidão
não seja mais do que um lugar comum
saber que existes, aí, e estar contigo
mesmo que só o silêncio me responda
quando, uma vez mais te chamo.

Nuno Júdice
(1949)

Mais sobre Nuno Júdice em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Nuno_J%C3%BAdice