quarta-feira, 30 de abril de 2014

“A arte de tirar dinheiro dos bolsos dos outros sem usar violência.”
(Max Amsterdam)

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Numa pequena ilha, Tenos ou Andros, não me lembro,
perdido no tempo, junto a um limoeiro já sem frutos,
um velho aedo, olhos parados, cantava ainda
histórias de deuses, suas quezílias, feitos de heróis.
Se detinha contando de Éris uma velha lenda,
e tudo confundia ao recordar os factos ocorridos.
Parava um pouco, às vezes, para tornar à lengalenga,
a mesma, nomes diversos, misturando reis, heróis,
tantas coisas seus olhos cansados tinham visto já.
Na colina suave, o velho aedo, junto ao limoeiro,
recortava-se bizarramente contra o céu azul.
Do sul, de África, vinha um vento suave, adormecente,
e o sol caía, indiferente, para os lados da Pérsia.
Sem ninguém a ouvi-lo, desanimado, o velho
pensava nos que viriam depois contar o mesmo.

António de Almeida Mattos, in Água Clara - Poetas em Vila Viçosa (Lisboa, 1987)

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"A arte é um resumo da natureza feito pela imaginação."~ Eça de Queirós

terça-feira, 29 de abril de 2014

1972 - Carlos Mendes - A Festa Da Vida.mp4

Quiero como él, vivir y contemplar,

quiero como él vivir sin miedo al silencio que incita a pensar,

no temer a las horas que no regresarán,

dominar el tiempo sobre el que reposa,

el espacio donde descansa,

olvidar la sombra que dejo atrás y jamás preguntar qué hice mal.

Como él quiero abrigar la calma y vencer en la paz.

Su territorio nunca fue nuestro igual,

el nuestro donde la vida es un juego de peones sin rey,

tierras sin ley, traidores sin fe, mentiras de verdad,

relucientes máscaras huecas y abismos sin red.

Quiero su imperio, ese que es propio y compartido,

el que se extiende generoso y juega

donde habita su ser real, su secreto leal,

de donde jamás huye la amistad,

el imperio en paz soñado,

un territorio donde nunca temamos ser

uno más en la magia de lo que nos crece bajo la piel.

Sartre - O Ser e o Nada




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domingo, 27 de abril de 2014



“Que nada nos defina. Que nada nos sujeite.
Que a liberdade seja a nossa própria substância.”

- Simone de Beauvoir

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I'm free to do what I want any old time
I'm free to do what I want any old time
So love me hold me love me hold me
I'm free to do what I want any old time

I'm free to sing my song knowing it's out of trend
I'm free to sing my song knowing it's out of trend
So love me hold hold me love me
'Cause I'm free to do any old time what I want

So love me hold hold me love me
I'm free to do any old time what I want

I'm free to choose who I see any old time
I'm free to bring who I choose any old time
Love me hold me love me hold me
I'm free to do what I want any old time

 
A gente já não sabe, até esquece o que bem dizer
Quando as palavras por demais redundam, quando
Quase todos acabamos algures, muito por dentro
Entre “Para quê dizer o que for se já ninguém ouve?"
E um lugar mal comum: “Será isto a Cidade, sede onde
Nem há dois séculos era suposto a Liberdade ocorrer
Ou mais uma filial da Solidão, mais um sítio banal
Sem nenhum além, sem nada para dar?" É só o que
A todos os cativos da atenção em monitores pergunto
"Que raio neste fátuo caminho nos espera?", creiam
Vendo nos vamos, mas indo nos fomos, bem mal fodidos 
Num enorme estupor, tantos num cubo, perto da cova  
Ou em 3D, todos ou quase, bom, incertos demasiados
Numa verdade comum a tantos outros, a sério, ninguém
Precisa realmente de mim, de ti, de nós ou de alguém
Além de uma espécie de fingimento, uma incerta precisão
De que o Outro é possível. Sabem que mais? Já não é!
Cristo morreu, Marx também, nem eu nem quase ninguém
Sabe bem de si, enfim, redenção cada vez mais impossível
Quase todos reclusos da nossa primeva natureza réptil
À toa entre piranhas e tubarões, esquecemos o ser gentil
A mal dizer, quase todos desistindo vamos de ser gente




*  19724  *



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segunda-feira, 21 de abril de 2014

"Se, por um instante, Deus se esquecesse de que sou uma marionete de trapo e me presenteasse com um pedaço de vida, possivelmente não diria tudo o que penso, mas, certamente pensaria em tudo o que digo.
Daria valor às coisas, não pelo que valem, mas pelo que significam. Dormiria pouco, sonharia mais, pois sei que a cada minuto que fechamos os olhos, perdemos sessenta segundos de luz.
Andaria quando os demais parassem. Acordaria quando os outros dormem. Escutaria quando os outros falassem e saborearia um bom sorvete de chocolate.
Deus meu, se eu tivesse um coração, escreveria meu ódio sobre o gelo e esperaria que o sol saísse. Regaria as rosas com minhas lágrimas para sentir a dor dos espinhos e o encarnado beijo de suas pétalas.
Deus meu, se eu tivesse um pedaço de vida não deixaria passar um só dia sem dizer às gentes: “Te amo, te amo, te amo.”
Convenceria cada mulher e cada homem que são os meus favoritos e viveria enamorado de amor. Aos homens, lhes provaria como estão enganados ao pensar que deixam de se apaixonar quando envelhecem, sem saber que envelhecem quando deixam de se apaixonar pela vida.
A uma criança lhe daria asas. Mas deixaria que aprendesse a voar sozinha.
Aos velhos ensinaria que a morte não chega com a velhice, mas com o esquecimento.
Tantas coisas aprendi com vocês, homens.
Aprendi que todo mundo quer viver no cimo da montanha, sem saber que a verdadeira felicidade está na forma de subir a escarpa.
Aprendi que quando um recém-nascido aperta, com sua pequena mão, pela primeira vez o dedo de seu pai, o tem prisioneiro para sempre.
Aprendi que um homem só tem o direito de olhar um outro, de cima para baixo, para ajudá-lo a levantar-se.
São tantas as coisas que pude aprender com vocês. Ah! Se Deus me desse um pedaço de vida."

Gabriel García Márquez (1927 - 2014)

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Divina Voz, divino Sopro santo,
respiro-me em teu Voo, veloz Amor.
E sinto-me pequeno de poesia.
Vezes uns uivos, longe de ser canto

vestem-me os pêlos como Manto novo,
cordas revoando. Louvo-te Senhor.
Tenho em roda ao pescoço uma coleira
de cão, de pobre cão entre o meu povo.

Nem sei dizer se esse mudado Verbo,
nem si dizer se essa gaguêz furiosa,
essa rosa de vento que é meu berro

se tornou na asfixia de Teu perro
- canto com que cantar-te, canto-chão,
nessa Tua divina ventania.

Jorge de Lima (1893-1953), poeta brasileiro

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Breve História de Ninguém

Diz o senhor Nabokov que a literatura não nasceu quando uma criança de um vale do Neandertal chegou a gritar: Um lobo! Um lobo!, e atrás dela, as quatro patas no ar, um lobo cinzento brandia a sua língua estralejante.
Diz, melhor, que a literatura nasceu quando uma criança de um vale do Neandertal chegou a gritar: Um lobo! Um lobo!, e atrás dela não vinha ninguém.
Desde então, ninguém é um personagem eterno, um fantasma nos vales do poema.

in Os Cinco Enterros de Fernando Pessoa. É uma antologia poética de Juan Manuel Roca, um dos nomes mais importantes da poesia da Colômbia, nascido no ano de 1946

sábado, 5 de abril de 2014

Jose Gonzalez - Stay Alive





Stay Alive

There’s a rhythm in rush these days
Where the lights don’t move and the colors don’t fade
Leaves you empty with nothing but dreams
In a world gone shallow
In a world gone lean

Sometimes there’s things a man cannot know
Gears won’t turn and the leaves won’t grow
There’s no place to run and no gasoline
Engine won’t turn
And the train won’t leave

Engines won’t turn and the train won’t leave

I will stay with you tonight
Hold you close ‘til the morning light
In the morning watch a new day rise
We’ll do whatever just to stay alive
We’ll do whatever just to stay alive

Well the way I feel is the way I write
It isn’t like the thoughts of the man who lies
There is a truth and it’s on our side
Dawn is coming
Open your eyes
Look into the sun as the new days rise

And I will wait for you tonight
You’re here forever and you’re by my side
I’ve been waiting all my life
To feel your heart as it’s keeping time
We’ll do whatever just to stay alive

Dawn is coming
Open your eyes
Dawn is coming
Open your eyes
Dawn is coming
Open your eyes
Dawn is coming
Open your eyes

Look into the sun as the new days rise
There’s a rhythm in rush these days
Where the lights don’t move and the colors don’t fade
Leaves you empty with nothing but dreams
In a world gone shallow
In a world gone lean

But there is a truth and it’s on our side
Dawn is coming open your eyes
Look into the sun as a new days rise